quarta-feira, 23 de janeiro de 2013


Sucessão rural: o futuro da propriedade em jogo


Beatriz, Antonio e Joel Rossi

Atualmente 118.336 propriedades rurais não têm sucessor definido no Rio Grande do Sul. No Brasil, a agricultura familiar responde por grande parte da produção de alimentos para o consumo interno e também por volumosos excedentes para a exportação. A agricultura familiar é uma forma social de produzir, trabalhar e de se organizar.
 No entanto, a opção pela profissão de agricultor familiar não ocorre após os 16 ou 18 anos (período em que legalmente alguém pode trabalhar), mas vai sendo construída, definida e consolidada ao longo do tempo de convivência e de aprendizado com a família. Sem essa convivência familiar não se garante a sucessão na agricultura familiar.
 Segundo dados da Emater-RS, atualmente 118.336 propriedades rurais não têm sucessor definido no Rio Grande do Sul, o que corresponde a 31,3% das propriedades do Estado. O presidente da Emater-RS e superintendente geral da Ascar, Lino de David, menciona a falta de incentivo e a dificuldade de diálogo entre gerações como fatores que desestimulam a permanência dos jovens no campo. Além disso, o modelo de produção baseado na monocultura, aliado à urbanização e à busca por independência financeira, atrai os jovens para os centros urbanos. De David defende a valorização do meio rural como espaço de vida, e não somente de trabalho e negócios.
 Já o presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Três de Maio e São José do Inhacorá, Pedrinho Signori, comenta que são muitos os fatores que não prendem os jovens no campo atualmente, entre eles, as escolas. “Desde criança, elas criam o hábito de ir para a cidade estudar e voltam para casa. Isso pesa bastante para as crianças, elas vão conhecendo outros hábitos, modos de vida. Outro ponto é o clima, que quando ocorre uma seca, o desânimo é perceptível. O salário na cidade, muitas vezes, é atrativo e garantido. Aí o jovem vem para a cidade, vai fim de semana para a casa dos pais, traz a carne, a salada, traz tudo. O jovem se ajeita. Porém, defendo que, temos muitas coisas boas no interior. Ali é o melhor lugar de se viver sim. Na opinião de Pedrinho, as vantagens do campo são tão grandes que algumas pessoas estão fazendo o processo contrário. Trabalhando muitos anos na cidade, depois compram chácaras para produzir algo e morar. “Mas essas pessoas que migram para o interior são pessoas com 50 anos ou mais, então, segue sendo preocupante o fato da sucessão rural, pois quem produzirá no dia de amanhã? A instabilidade financeira que os pais demonstram, devido que algumas safras, também é fator que deixa o filho inseguro, pois o jovem de hoje, quer algo certo, e isso eles não encontram no interior. Ele vê pessoas da cidade que tem dinheiro fixo, que conseguem comprar carro, moto em prestação, isso tudo vai influenciando”.            
De acordo com o presidente do STR, atualmente o interior conta com as mesmas tecnologias da cidade, como internet. “O jovem de casa, acessa a tudo que quem mora na cidade tem, mas infelizmente isso não basta, pois desde o princípio, quando a criança do interior vem para a cidade estudar, a cidade se mostra colorida, com festas, é uma fantasia, porém não é bem assim. Temos muitos exemplos em Três de Maio de pessoas jovens que retornaram para a colônia. Jovens que estavam em Caxias, Novo Hamburgo, voltaram e estão na roça. São exemplos fantásticos. Eles conseguiram comprar bens e estão felizes no campo”
 Um exemplo prático
 A família Rossi, de Medianeira, Três de Maio, possui uma área de 18 hectares de terra. O foco da família é a pecuária, por meio da produção de leite (700 litros/dia).
Beatriz e Antonio têm dois filhos. Ambos técnicos agrícola. O mais velho, Jonas, trabalha na cidade, em uma cooperativa. Já o mais jovem, Joel, até tentou a vida na cidade, mas aos poucos se convenceu que o melhor mesmo era voltar para o interior e investir trabalho, conhecimento e dedicação na propriedade da família.
Segundo Joel, no período em que trabalhou em Três de Maio, na cidade, passou por três empresas. “Eu tinha que pagar aluguel, me manter, enfim, vi, com o passar do tempo que tinha mais despesas que vantagens. Foi então que resolvi voltar e trabalhar no que é meu, da minha família, aplicar na nossa propriedade conhecimentos, buscar crescer”
Os pais de Joel admitem que quando os filhos eram menores, sonhavam que eles estudassem e arrumassem um bom emprego na cidade. Hoje, o casal diz pensar diferente. “O nosso filho que está na cidade está bem graças a Deus. Nos orgulhamos muito dele. É um rapaz trabalhador, que nos deixa tranquilos como pais. Mas, é engraçado como as coisas mudam com o tempo. Antes achávamos que os dois deveriam ir embora da lavoura e vemos que nem sempre é assim, que os jovens podem ser felizes, se realizar profissionalmente e ter coisas boas também aqui no interior”, relata Beatriz.
O pai, Antonio Rossi, comenta que o começo do trabalho na lavoura era mais braçal, artesanal e que hoje, existem mais opções de equipamento e tecnologia. “Começamos a produção de leite com cinco vacas. Trabalho a mão, tirando entre 30 e 35 litros de leite ao dia. Isso foi lá em 1985, mesmo ano que comprei a primeira ordenhadeira. Logo nossa produção subiu para 56 litros de leite/dia. Hoje o número de animais é maior, a produção é maior e o trabalho mais simplificado graças à tecnologia e graças ao apoio dos nossos filhos. Um trabalha aqui, conosco no dia a dia sempre ajudando, fazendo o que é mais pesado. O outro filho, sempre que pode ajuda de alguma forma, enfim, é muito bom ter os filhos por perto. Ficamos tranquilos sabendo que teremos sucessores e que aquele nosso trabalho que começou lá atrás, não vai parar tão cedo”, finaliza.
FONTE: http://www.cooperjornal.com.br/noticias/Agricultura/1782

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